A pandemia da Covid-19 mudou repentinamente o modelo de ensino e os professores e alunos tiveram que se adaptar rapidamente em aulas à distância, realizadas pela internet. No início da pandemia, cerca de 4,2 milhões de alunos do ensino médio foram obrigados a estudar por esse método de ensino não presencial, para compensar a falta de aulas durante a quarentena.
Ninguém esperava esse momento, em que as escolas precisaram adaptar seus recursos de maneira emergencial, assim como professores e alunos passaram a utilizar dispositivos tecnológicos como ferramentas para a realização das aulas. Foi um processo que trouxe inúmeros desafios para as instituições de ensino, profissionais de educação, pais e alunos. Junto a isso, claro, houve certa falta de apoio governamental, que dificultou a tomada de decisões sobre o material didático para esse tipo de aula e, em muitos casos, muitas famílias não puderam utilizar esses serviços por causa da falta de infraestrutura para o acesso à internet.
Junto a esse cenário de emergência e improvisos, outra questão tem sido bastante dialogada entre os pais dos alunos sobre o ensino à distância. Há uma percepção de que muitos estudantes têm apresentado dificuldades na aprendizagem, sendo algumas delas relacionadas à falta de atenção durante às aulas pela internet.
Porém, em alguns casos, esse problema de aprendizado não está atrelado apenas à atenção dos estudantes. Uma parte dos alunos pode estar com dificuldades de acompanhar as aulas devido a problemas auditivos e, algumas vezes, passa desapercebido por educadores e pais de alunos.
Existem duas possibilidades que afetam a audição das pessoas: a perda auditiva, mesmo que em grau leve; e o transtorno do processamento auditivo. Ou seja, a relação entre o processamento auditivo central e aprendizagem escolar é um caso importante e que precisa das devidas atenções para preservar o bom desenvolvimento educacional das crianças.
Estudos como da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Gazi, em Ankara, e a Universidade Biruni, em Istambul, ambas na Turquia, constataram que parte dos alunos que possuem transtorno do processamento auditivo, demonstram dificuldade na aprendizagem e na aquisição de leitura e escrita, sendo manifestadas especialmente no ambiente escolar.
O transtorno do processamento também causa aos estudantes problemas para manter a atenção, recordar o que aprende na aula expositiva, distraem-se facilmente com os sons da sala de aula, respondem de forma mais lenta e pedem para o professor repetir a informação muitas vezes, o que torna essencial o treinamento dos professores para identificar esses sintomas e encaminhar os alunos para uma avaliação fonoaudiológica.
É sempre importante avaliar se o aluno escuta bem. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), das 466 milhões de pessoas que tiveram perda auditiva no mundo em 2020, 34 milhões eram crianças. Destas, 60% têm perda auditiva provocada por causas evitáveis, sendo que muitas apresentam perdas leves, que não são facilmente percebidas.
Por isso, estudantes que já apresentavam dificuldades nas aulas presenciais tendem a sentir mais problemas no modelo de ensino à distância. Diante disso, é preciso estar atento.
Se professores e pais perceberem essas dificuldades, é recomendado pedir uma avaliação profissional, para assim minimizar o impacto na aprendizagem. Apesar do medo em relação à pandemia, é importante ressaltar que clínicas, hospitais e consultórios estão preparados para realizar esses exames com todas as orientações de proteção contra o novo coronavírus.
Outra questão que pode interferir no processo de aprendizagem e compreensão é se o aluno processa bem o som que ouve. Isso porque, além de ouvir bem, é necessário que o som seja processado corretamente, para que o cérebro seja capaz de separar a voz da professora ao do ruído no ambiente, por exemplo.
As pessoas que possuem Transtorno do Processamento Auditivo, apresentam algumas dificuldades como: ouve bem, mas não compreende corretamente o som; tem dificuldade de escutar diante de algum ruído; não consegue localizar a origem do som; distrai-se facilmente, não consegue entender piadas com duplo sentido; não aprende com facilidade uma segunda língua ou instrumentos musicais; e deixa o volume da televisão muito alto. Para avaliar esses distúrbios, sugere-se a realização do exame de audiometria, que verifica o quanto a criança escuta, juntamente com a avaliação do processamento auditivo para ver como ela escuta.
Além dos tradicionais exames médicos, também é fundamental ter um local de estudo adequado para as crianças aprenderem. Trata-se de ajustes que irão melhorar o ambiente e proporcionar melhores condições para o aprendizado. Escolha um ambiente silencioso em casa para as aulas, use fones de ouvido corretos para reduzir os possíveis ruídos externos e retire distraidores próximos, como televisão ligada ou pessoas conversando por perto, são algumas ações que irão ajudar. A criação de uma rotina para as crianças, com estudo e momentos de brincadeiras e descanso, também será importante na melhoria do cotidiano das aulas à distância.
Cada pessoa tem o seu nível de adquirir o aprendizado, gerado por um sistema corporal maravilhoso como o nosso, que trabalha e age em comunhão com o ambiente e tudo que está ao redor. Disponibilizar para as crianças um espaço confortável durante as aulas ajudará, e muito, elas terem melhores condições de concentração e compreensão do que está sendo passado pelos professores.
Para entender bem a aula, o ouvido precisa captar o som e o cérebro dar significado à fonética das palavras, e isso só será possível com a devida atenção dos responsáveis e muita paciência para saber o motivo das dificuldades de aprender uma lição. Afinal, o que essas crianças precisam nesse momento é do nosso amor para conseguirem enfrentar esse período de isolamento social com calma e se desenvolverem como indivíduos sem traumas futuros.
por Andréa Soares – Fonoaudióloga da Fonotom
Andréa Soares – Fonoaudióloga CRFa.2-11424
Formada em Fonoaudiologia pela PUC de São Paulo, Andréa Soares é mestranda em Saúde da Comunicação Humana - Santa Casa SP. É sócia-fundadora da clínica fonoaudiológica, Fonotom, e tem especialização em audiologia. Com mais de 20 anos de experiência, atuou no atendimento clínico da rede pública do SUS, em consultórios especializados no tratamento de audiologia, em adaptação de prótese auditiva e com saúde auditiva de músicos.